A presidente do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM-MT), Hildenete Monteiro Fortes, disse ser contra a antecipação da formatura dos estudantes de medicina e avaliou que, com o relaxamento das medidas restritivas, podem aumentar consideravelmente o número de casos da doença e citou os ônibus lotados.
Ela também avalia que os casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) podem estar sendo subnotificados, já que aumentou muito o número de mortes, e que exames devem ser feitos para verificar se na verdade os pacientes estavam infectados com o novo coronavírus ou com H1N1.
Desde o início da pandemia, o CRM está se posicionando em todos os âmbitos que envolve o contágio da doença, da disseminação até a proteção dos profissionais da saúde.
Bom dia MT: Nós estamos vendo que o ponto de ônibus está com muitas pessoas aglomeradas. Tem as imagens da Caixa Econômica Federal também com muita gente. Como profissional da saúde, qual o sentimento de ver essas imagens?
Hildenete Fortes: O sentimento é de tristeza, porque eu acho que a população já deveria ter sido conscientizada e já foi sobre a questão do distanciamento. É preciso de que se mantenha pelo menos 1 metro e meio de distância. Isso vem sendo falado maciçamente e as pessoas continuam não obedecendo. Isso é extremamente importante. O distanciamento, o uso da máscara, a higienização frequente das mãos e o uso do álcool em gel. São importantíssimos porque com a reabertura do comércio, se nós não tomarmos os cuidados, provavelmente vai ter um pico muito alto de casos de coronavírus.
Bom dia MT: O número de casos de COVID-19 em Mato Grosso em comparação com outros estados, ainda são menores. É um dos estados que menos têm casos, menos mortes, mas nós tivemos um estouro dos casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Você acredita em subnotificação ou isso é uma ilação?
Hildenete Fortes: Eu acredito que seja realmente subnotificação. Esses casos que o Ministério Público apurou junto com os cartórios, de óbitos de SRAG, eu não sei se estão sendo investigados, se eles realmente colheram o material para fazer a notificação se fosse caso de Covid-19. Então eu acho que existe realmente uma subnotificação.
Bom dia MT: E isso é perigoso?
Hildenete: É perigoso porque se nós temos essas subnotificações as pessoas de Cuiabá estão achando que tem 2 casos e que isso não vai disseminar, que está tranquilo e nós não podemos pensar que está tranquilo. Nós temos que tomar o cuidado porque pode vir um aumento muito grande e vai faltar leitos de UTI. Eu acho que foi importante a restrição de saída da população e de todos esses usos dos equipamentos de proteção individuais para diminuir os casos, porque estamos aguardando esse pico agora nesse mês de maio, principalmente.
Bom dia MT: Nesse período, tem temas que são polêmicos. A telemedicina é excepcional. Como o atendimento à distância está ajudando?
Hildenete: O Conselho Federal de Medicina tinha liberado para que os médicos fizessem a tele orientação, o telemonitoramento e a teleconsulta. Essa tele consulta seria de médico para médico, inicialmente, e não tinha sido liberado de médico para paciente. A liberação nesse momento de pandemia foi importante justamente para evitar aglomerações e circulação de pessoas. Melhorou, também, no relacionamento entre médico, paciente e farmacêutico. O médico tem agora a facilidade de fazer a receita digital que pode ser encaminhada para o paciente via SMS. Esse paciente pode ir com o celular e o farmacêutico vai validar essa receita. O farmacêutico então, vai ver se o CRM é do médico e o código da receita para que ela não seja utilizada novamente. Às vezes as pessoas perguntam qual que é a diferença da receita digital da receita digitalizada. Na digitalizada, o médico faz em papel, fotografa e envia para o paciente. Essa receita não serve, porque esse paciente pode imprimir e comprar em várias farmácias o medicamento prescrito. A receita digital é essa que o farmacêutico pode validar, a que tem o código.
Bom dia MT: Foi necessário aprimorar o teleatendimento. Será que depois da pandemia vai virar uma tendência?
Hildenete: Com certeza vai, mas por enquanto, a lei é para a tele consulta seja feita durante a pandemia. Depois da pandemia vai ser feito uma outra avaliação em relação a isso. Nós já temos a tele radiologia. Muitos serviços de Radiologia, o médico fica a distância, dá o laudo a distância e não precisa estar exatamente naquele local. No interior eles contratam médicos ou empresas aqui de Cuiabá para dar o diagnóstico.
Bom dia MT: Doutora, outro tema polêmico é a antecipação da formatura dos estudantes de medicina que já cumpriram três quartos do curso. Isso tem acontecido no Brasil inteiro. Aqui em Mato Grosso, alunos daqui de Cuiabá, estão reclamando que a faculdade estaria impedindo o acesso dos estudantes a colação de grau e o Conselho Federal de Medicina se posicionou contrário a isso. Isso aconteceu no mundo inteiro, outros países também anteciparam a formação de estudantes de medicina para que eles pudessem reforçar o atendimento ao coronavirus. Por que o posicionamento em contrário?
Hildenete: Nós do Conselho Regional Medicina e Conselho Federal de Medicina, acreditamos que esse médico não tem a formação total ainda. Esses 25% que falta para que ele cumpra a carga horária podem fazer falta. E qual a garantia que nós temos de que esses médicos recém-formados vão atuar em frente ao Covid-19? Quem vai supervisionar isso? Aqui em Mato Grosso, nós temos a Unemat que antecipou a formação dos alunos e a UFMT, então são mais ou menos 77 médicos que anteciparam a formatura.
Hildenete: Não, por exemplo, a Univag não tem os alunos, eles entraram no sexto ano agora então não tem 75% cumprido, por isso que ela não vai formar os alunos. A Unic está em discussão ainda porque isso cabe a universidade, elas que vão decidir se antecipa ou não.
Bom dia MT: Sobre equipamentos de proteção individual. Nós vimos que no Brasil inteiro, casos de profissionais da saúde, técnicos de enfermagem, enfermeiros e médicos, além de ficarem doentes, estão morrendo por COVID-19 e nós temos abordado isso com vocês já há algumas semanas. Como que está essa situação agora? O Conselho Regional de Medicina firmou parcerias para a compra de equipamentos de proteção individual? Essa ainda é uma preocupação de vocês aqui localmente? Diante do cenário em que Mato Grosso, vocês ainda estão preocupados?
Hildenete: Ainda estamos preocupados. O Conselho Federal abriu um canal para denúncia de falta de equipamento. Nós também temos a ouvidoria para que seja feita essas denúncias, e aqui em Cuiabá todos os locais que foram denunciados por falta de equipamentos, o CRM fez a fiscalização. Não estavam faltando tanto material de proteção. Às vezes faltavam uma máscara N95 ou um protetor facial. No interior teve uma denúncia que foi muito grave para nós, tivemos que ir até Tangará da Serra e para a nossa surpresa e da fiscalização todas as unidades tinham todos os equipamentos de proteção individual, não faltava absolutamente nada. Então eu acho que como nós estávamos encaminhando todas essas denúncias para o Ministério Público do Trabalho, eles provavelmente estavam acionando esses diretores e gestores. Houve realmente a preocupação de dar o equipamento de proteção para os profissionais da saúde.
Bom dia MT: Outro assunto que mobilizou muitas discussões nas últimas semanas, inclusive incentivada pelo presidente Jair Bolsonaro, é uso da hidroxicloroquina e da cloroquina para o tratamento de paciente com Covid-19. Nas últimas semanas, isso deu uma diminuída porque alguns médicos em outras partes do país estavam prescrevendo esses medicamentos para os pacientes já com a Covid-19. Qual é o posicionamento de vocês em relação ao receituário desses medicamentos?
Hildenete: Primeiro que esse medicamento passou a ser um medicamento de controle especial. O Conselho Federal estava aceitando a prescrição da hidroxicloroquina apenas para os pacientes graves e logo depois da saída do Ministro, passou a aceitar a indicação da hidroxicloroquina para todos os casos: leves, moderados e graves. Agora o que está acontecendo é a diminuição do uso quantitativo. Houve a situação que aconteceu em Manaus com o uso de 1200 mg ocasionando 11 mortes de pacientes que estavam utilizando o medicamento. Então teve uma diminuição dessas indicações, mas eu acho que ela continua sendo usada para todos os casos, tanto na fase inicial, na leve, moderada e grave, mas o quantitativo que tem que ser em torno de 400 a 600 mg por dia.
Bom dia MT: Mas não são todos os pacientes que precisam, não é?
Hildenete: Não, vai da avaliação do médico. Se você está em uma fase inicial, tem que ser só observado e aí se for o caso e se houver progressão da doença, ela pode entrar com a com tratamento.
Bom dia MT: Sobre os alojamentos para os profissionais da Saúde. Aqui em Cuiabá um hotel foi disponibilizado para os profissionais da saúde. Você acha isso necessário? Que os profissionais da saúde fiquem em isolamento?
Hildenete: Isso foi uma solicitação do próprio Conselho Regional de Medicina. Não é uma coisa obrigatória. O profissional de saúde não é obrigado ir para esse hotel. O que nós pedimos é que se os profissionais que fossem detectados com o COVID-19, que ao invés de ir para sua residência que tem familiares, filhos ou pais mais idosos, que ficasse nesse hotel no período da quarentena. E, também para os outros profissionais que não tivesse sido contaminado, mas que não quisesse voltar para residência. Ficar no hotel, então, é uma maneira de prevenir a transmissão para os seus familiares.
Bom dia MT: Vamos falar novamente sobre a Síndrome Respiratória Aguda Grave e a Covid-19. Nós temos no restante do país, um aumento muito grande no número de casos e de mortes por problemas respiratórios. Está sendo levantado o questionamento de que isso poderia ser COVID-19. Você já falou que acredita que haja casos de subnotificações, não é?
Hildenete: Sim eu acredito. Todos esses casos de síndrome respiratória aguda têm que ser testados para a COVID-19, e isso não está sendo feito. É um erro porque aí realmente existe subnotificação, você fica sem saber se é COVID-19 ou se é uma síndrome respiratória causada por outro vírus.