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'A descoberta que me confortou após perder meu filho médico, aos 26 anos, para a covid-19'

Fernando Gurginski morreu em julho, após contrair o novo coronavírus na linha de frente do combate à pandemia, em Cuiabá (MT).

Data: Terça-feira, 25/08/2020 14:13
Fonte: G1 MT

Desde a infância, Fernando Augusto Gurginski queria ser médico para salvar vidas. Em seus últimos anos de vida, antes de ser afetado duramente pelo novo coronavírus, o jovem cumpriu o sonho de criança.

Ao longo do curso de medicina, na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), ele costumava dizer à família que havia se encontrado. "O meu filho não tinha dúvidas de que era aquilo que ele queria fazer por toda a vida", diz a professora Regiane Marçal Moreno da Cunha, mãe de Fernando.

Após concluir o curso, em outubro de 2018, o jovem trabalhou em hospitais públicos e particulares em Cuiabá e outros municípios mato-grossenses. O médico, que nasceu em Cianorte (PR), morava em Mato Grosso desde a adolescência.

Durante a pandemia de covid-19, ele se mostrou extremamente preocupado com a situação. No período, trabalhou arduamente. Ao contrair o coronavírus, não resistiu. Morreu em julho, aos 26 anos.

O jovem se tornou uma das vítimas do vírus, que até o momento matou mais de 115 mil pessoas no país. Conforme o Ministério da Saúde, 189 médicos que estavam na linha de frente do combate ao coronavírus morreram de covid-19 no país entre março e julho.

Em meio à dor, Regiane revela ter feito uma descoberta que a confortou: a conduta humanizada de Fernando como médico. Ela conta que a família recebeu mensagens de conforto e relatos de pessoas que foram atendidas pelo jovem e elogiaram a postura dele.

"Eu sabia que o meu filho era um bom médico, mas não imaginava que ele fosse um profissional tão humano. Descobrir o carinho que as pessoas tinham por ele foi muito importante pra mim", revela a mãe dele à BBC News Brasil.

 

O sonho de ser médico

 

Fernando era considerado um bom aluno desde a infância. "Ele tinha um método diferente dos outros. Enquanto os amigos precisavam estudar um mês para as provas, ele revisava o conteúdo no dia anterior e conseguia tirar boas notas", diz Regiane. Ela conta que os professores do filho sempre elogiavam o bom desempenho dele nas aulas.

Além do foco nos estudos, o médico também era apaixonado por pescaria, games e música. "Ele era autodidata. Aprendeu a tocar guitarra e violão sozinho", revela a mãe.

Após concluir o Ensino Médio, Fernando ficou em dúvida entre Medicina e Engenharia Nuclear. "Ele passou em cinco universidades públicas. No fim, decidiu ficar em Cuiabá para estudar Medicina, que era realmente o sonho dele", relata a mãe.

Na universidade, o jovem se destacava na turma pela altura — ele tinha 1,98m —, pela simpatia e pela dedicação aos estudos. Gurja, como os amigos costumavam chamá-lo, era definido como um profissional extremamente apaixonado pela Medicina.

Com menos de dois anos de formado, enfrentou o maior desafio da carreira: o combate à covid-19. Preocupado com a mãe e com o padrasto, ele avisou que só veria a família quando a pandemia acabasse. "A última vez em que nos vimos foi em março. Morávamos perto. Eu o chamei algumas vezes para ir à minha casa, mas ele dizia que não podia, porque tinha medo de passar o vírus para mim ou para o meu marido (padrasto de Fernando)", relata Regiane.

Diariamente, ele falava por meio do WhatsApp com a mãe, em Cuiabá, e com o pai, que mora em Cianorte.

A preocupação de Fernando com o trabalho se tornou ainda maior durante a pandemia. "Ele passava o dia preocupado com os pacientes com a covid-19, tinha medo de faltar equipamentos de ventilação mecânica ou leitos", conta a mãe do médico.

Após meses no enfrentamento à pandemia, ele foi infectado pelo novo coronavírus. "Em 28 de junho, o meu filho me mandou um áudio em que disse, tranquilo, que estava com a covid-19. Ele ficou isolado em casa e pegou afastamento do trabalho por 14 dias. Ele estava muito calmo e aquilo me passou tranquilidade. Não achei que a situação dele fosse se complicar", diz Regiane.

 

A covid-19

 

Três dias após ser diagnosticado com a covid-19, Fernando piorou. Ele foi ao hospital e descobriu que havia comprometimento de 50% de seus pulmões.