O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na sexta-feira, 18, na última sessão de 2020, que pequenas propriedades rurais não podem ser penhoradas para pagamento de dívidas decorrentes da atividade produtiva. Segundo entendimento da maioria, isso é válido mesmo quando a família é dona de mais de um terreno, desde que não exceda, somando as áreas, mais de quatro módulos fiscais do município.
O caso que chegou à Corte e suscitou a discussão foi o de um produtor do Paraná, que acabou não conseguindo quitar débitos de insumos. Para complicar a situação, o agricultor havia oferecido a propriedade como garantia à empresa fornecedora.
O relator do caso, ministro Edson Fachin, baseou sua decisão no Artigo 5º da Constituição Federal, alegando que a lei prevê a impenhorabilidade da pequena propriedade rural e restringe exceções, focando na proteção da família e não necessariamente do patrimônio do produtor. “As regras de impenhorabilidade do bem de família, assim como da propriedade rural, pautam-se no princípio da dignidade humana e servem para garantir a preservação de um patrimônio mínimo”, diz.
Fachin destaca que o texto não delimita o que seria uma pequena propriedade rural, por isso foi necessário recorrer ao Estatuto da Terra (Lei 4.505 de 1964) e à Lei de Reforma Agrária (8.629 de 1993), sendo que essa última determina que em seu Artigo 4º que pequena propriedade rural é uma “área até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento”.
Segundo Fachin, isso deve ser respeitado “mesmo quando são proprietários de outros imóveis rurais, ainda que hajam dado o bem em garantia”.
Os ministros Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber votaram acompanhando o relator.
Os ministros Luis Roberto Barroso e Nunes Marques divergiram de Fachin em alguns pontos, entre eles o fato de o produtor ter dado a propriedade como garantia à empresa fornecedora.
Barroso argumentou que a Corte não pode tomar uma decisão desta importância sem levar em consideração o efeito sistêmico. “No caso concreto, a generalização do entendimento firmado pela instância a quo produzirá grave impacto negativo sobre o mercado de crédito rural para pequenos proprietários. A aparente proteção concedida importará, na prática, em desproteção abrangente”, pontua.
O ministro ressalta que a garantia oferecida pelo produtor foi “fator determinante para a própria celebração do contrato” com a empresa fornecedora. Por isso, para ele, é “exceção razoável e proporcional à impenhorabilidade da pequena propriedade rural. Aplicação dos princípios da segurança jurídica e da boa-fé objetiva quando o imóvel for oferecido voluntariamente como garantia hipotecária para viabilizar a livre iniciativa”, diz.
Já o ministro Nunes Marques foi mais conciso, mas não mesmo enfático em seu voto. Segundo ele, oferecer um bem como garantia real torna a propriedade penhorável. “Admitir o contrário se constituiria, a um só tempo, em enriquecimento ilícito, bem como em clara violação do princípio da boa-fé objetiva”, diz.
Alexandre de Moraes e Luiz Fux seguiram votaram seguindo Barroso. Gilmar Mendes acompanhou Marques.