Mesmo sob críticas de sociedades médicas e entidades da saúde, o governo federal mantém o alerta para que pais e responsáveis busquem recomendação de pediatra antes de vacinar as crianças contra a Covid-19. O pedido, reiterado pelo Ministério da Saúde, acompanha o anúncio da distribuição de mais 2,5 milhões de vacinas infantis, cuja entrega aos entes federados termina nesta quinta-feira (27).
No texto divulgado pelo ministério na última terça-feira (25) e atualizado nesta quarta (26), a pasta diz que a "orientação é que os pais ou responsáveis por suas crianças procurem a recomendação prévia de um médico antes da imunização". Para vacinar as crianças entre 5 e 11 anos, o ministério demanda a autorização dos pais, mas não cobra a prescrição médica. "Em caso de ausência de pais ou responsáveis, a vacinação deverá ser autorizada por um termo de assentimento por escrito", detalha o texto.
Antes de acrescentar a vacinação infantil ao PNO (Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra Covid-19), o ministro Marcelo Queiroga chegou a anunciar que o parecer médico seria incorporado de forma obrigatória, mas, após debate com entidades da saúde e o próprio posicionamento dos cidadãos em consulta pública, o governo voltou atrás.
A medida divulgada pelo ministério é vista por especialistas e membros da comunidade médica como um dificultador à adesão à campanha por causar desconfiança dos pais em relação à segurança da imunização, além de gerar uma demanda desnecessária e desigual na procura por pediatras.
O Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) mantém a posição de descartar a necessidade de apresentação de qualquer documento médico com val para a vacina. "A ciência vencerá. A fraternidade vencerá. A medicina vencerá, e vocês estarão protegidos", defende o conselho. Para SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), "a população não deve temer a vacina, mas sim a doença que ela busca prevenir", diz comunicado da instituição.
Na avaliação do pediatra e infectologista Renato Kfouri, consultor do Comitê Extraordinário de Monitoramento da Covid-19 da AMB (Associação Médica Brasileira), a recomendação levanta dúvidas quanto aos benefícios da vacinação. Mas ele frisa: "Há razões de sobra para vacinar as crianças, sejam elas éticas, sanitárias, epidemiológicas e protecionistas, tanto para a saúde individual quanto coletiva. As vacinas são seguras, estão licenciadas no país e sendo utilizadas [em crianças] em mais de uma dúzia de países pelo mundo".
A médica pediatra Isabella Ballalai, representante da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), também alerta sobre o fato de que a falta de incentivo gera dúvidas na população, mas ela acredita que a cultura vacinal brasileira vai superar essa barreira. "A dica para os pais é que, agora, a decisão está nas mãos deles. A maioria das sociedades médicas, talvez a totalidade, se coloca pró-vacina. Então, a nossa recomendação é que os pais levem os filhos para receber a vacina contra a Covid-19."
O Brasil está no terceiro lote de vacinas pediátricas entregues aos estados e ao Distrito Federal. Dos 2,5 milhões de imunizantes, 1,8 milhão são vacinas de RNA mensageiro e 734 mil doses são do imunizante do Instituto Butantan, CoronaVac.
A vacina do Butantan terá a mesma dosagem para crianças e adultos e, por isso, a embalagem não muda. Como não há diferenciação, estados que já tinham doses da CoronaVac em estoque podem direcioná-las ao público infantojuvenil. O intervalo recomendado entre as doses é de 28 dias.
No caso da Pfizer, as remessas são exclusivas para as crianças de 5 a 11 anos. Isso porque, nessa faixa etária, a dosagem é um terço da aplicada em pessoas a partir dos 12 anos. Para evitar confusão, a vacina vem em um frasco laranja, enquanto a de adultos é armazenada em um recipiente com rótulo roxo. A recomendação de intervalo é de oito semanas entre as duas aplicações.
"O Ministério da Saúde reforça que os gestores locais do SUS (Sistema Único de Saúde) devem seguir a recomendação da pasta e aplicar a vacina pediátrica de acordo com a ordem de prioridades, começando pelas crianças com comorbidades, deficiências permanentes e indígenas", reforça o Ministério da Saúde. As aplicações também devem ocorrer em ambientes separados dos de adultos, a fim de evitar erros vacinais.