Após a aprovação do projeto de lei do marco temporal para terras indígenas na Câmara dos Deputados, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai tentar reverter a situação no Senado. Para isso, os articuladores políticos têm conversado com os senadores, a fim de evitar uma nova derrota no Congresso Nacional.
O marco temporal cria a tese de que os povos indígenas têm o direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam na data da promulgação da atual Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. O texto foi aprovado na Câmara na terça-feira (30) e agora está sob análise dos senadores. O tema, contudo, deve ter uma tramitação mais lenta.
A intenção dos senadores é avaliar a medida em comissões antes de submetê-la diretamente a análise em plenário, com regime de urgência, como ocorreu na Câmara. "Prudência é submeter à comissão antes de submeter ao plenário, permitindo a quem queira debater o tema que também debata no Senado", disse o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Outra estratégia avaliada pela bancada ambientalista é segurar a votação até que haja uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema, em um julgamento marcado para a próxima quarta-feira (7). O relator da ação, ministro Edson Fachin, por sua vez, já votou contra a tese do marco temporal.
A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, definiu o projeto de lei do marco temporal para demarcação de terras indígenas como uma ferramenta de "genocídio legislado".
Não é possível que este Congresso Nacional faça com que este dia fique marcado como um legado daqueles que aprovaram [um projeto de lei] contra a vida dos povos indígenas.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), justificou a aprovação do marco como uma sinalização ao STF de que a Casa trata o tema com "responsabilidade" e defendeu a ideia de que os povos originários tenham a possibilidade de explorar as próprias terras. "Nós não temos nada contra povos originários", disse Lira.
Um parecer da Advocacia-Geral da União de 2009 trata do assunto e usa a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, como um exemplo de aplicação desse critério. Em Santa Catarina, uma parte da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ também é usada como referência. O governo do estado requer parte da terra ocupada pelos indígenas xoklengs e disputada com o argumento de que essa área, de aproximadamente 80 mil m², não estava ocupada em 5 de outubro de 1988.
Os indígenas rejeitam todos esses argumentos. Os xoklengs, por exemplo, argumentam que a terra estava desocupada na ocasião porque eles tinham sido expulsos de lá. A decisão sobre o caso de Santa Catarina está nas mãos do Supremo Tribunal Federal (STF) e determinará o entendimento sobre essa situação e a validade ou não do marco temporal das terras indígenas em todo o país. A decisão impactará mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas que estão pendentes.