A negociação de uma eventual reforma ministerial deve ser decisiva para o destino da agenda do governo no Congresso Nacional no segundo semestre, avaliam cientistas políticos ouvidos pelo R7. A partir de agosto, quando retornarem do recesso parlamentar, deputados e senadores voltarão a analisar as novas regras fiscais do país, a reforma tributária e o voto de qualidade do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), temas essenciais para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A âncora fiscal, aprovada pelos senadores em junho, terá de voltar para a Câmara dos Deputados, devido às mudanças incluídas pelo Senado. A reforma tributária, que recebeu o sinal verde dos deputados no início de julho, ainda precisa do aval dos senadores.
A retomada do voto de qualidade do Carf, que permite a representantes do Executivo desempatarem votações em julgamentos de processos tributários na Receita Federal, pode ampliar a arrecadação federal. A medida foi aprovada pela Câmara no início do mês e ainda carece de análise do Senado.
Os três projetos, tidos pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) como as "balas de prata" do governo Lula, dependem de negociações com o Planalto para ser concluídos no Congresso.
Como o R7 mostrou, o presidente deve promover algumas mudanças na Esplanada dos Ministérios, depois de o centrão cobrar a fatura pela aprovação da reforma tributária na Câmara com folga — no segundo turno, foram 375 votos a favor, 113 contrários e 3 abstenções. Já no primeiro turno, foram 382 votos favoráveis e 118 votos contra. Eram necessários 308 votos para a aprovação da proposta.
"Quando vai mexer numa questão dessas, é muita gente envolvida, o guarda-chuva é muito grande. Alguém vai ter de ceder e perder. É o dilema da chamada frente ampla: é muito grande, não cabe todo mundo nesse barco. Vai ter de jogar gente no mar", analisa o cientista político André César.
O especialista aposta na troca de aliados de primeira hora do governo federal. "É possível que PSD, PCdoB e até o PT percam espaço em ministérios, para trazer gente do centrão, que não sabemos o quanto é capaz de entregar em votos, se consegue dar tudo o que pretende. [O governo] pode estar queimando aliados em busca de uma resposta que não é garantida", completa.
Para César, o voto de qualidade do Carf deve passar com tranquilidade pelo Senado, porque a questão já está pacificada. A tramitação das regras fiscais e a da reforma tributária, no entanto, tendem a gerar ruídos.
"Na Câmara, o arcabouço [fiscal] fechou o primeiro semestre dependendo de entendimentos e acordos, com o relator [deputado Claudio Cajado (PP-BA)] falando que ainda estão trabalhando as mudanças do Senado", avalia o cientista político, para quem a reforma tributária é o tema que pode causar os maiores embates a partir da próxima semana.
"Já passou aquela coisa da felicidade [da aprovação], de ter passado a madrugada votando, com uma ressaca boa. Agora, começam a aparecer os buracos — muitos setores foram contemplados e muitos não foram, e estão vendo as forças assimétricas. Assim, vão se abrindo exceções. A questão dos estados, com o dispositivo que permite criarem impostos para financiar projetos de infraestrutura, é um jabuti muito esquisito. Me parece que, no Senado, [a aprovação] não vai ser tão rápida quanto na Câmara. O setor de serviços e a construção civil, por exemplo, apareceram. Quem não foi contemplado no texto da Câmara vai, agora, para cima — e tem muita gente. No pior cenário, no mais extremo, isso pode inviablizar o texto".
"A Câmara quer mais espaço na Esplanada, hoje com uma influência muito grande do Senado. No início do ano, o Senado ganhou mais espaço do que a Câmara [nos ministérios] porque, no Senado, havia uma sinalização de composição maior. Agora, o governo está pressionado a acomodar os aliados da Câmara, e esse espaço pode ser retirado de outros partidos, inclusive do próprio PT, mas também pode ser retirado do Senado, que está com algumas das principais pautas atuais. A Câmara entregou o que o governo queria antes de receber. Agora, a Câmara precisa receber, e o presidente precisa fazer isso sem desagradar ao Senado".