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'Vi muita crueldade contra migrantes', diz jovem nascido na fronteira dos EUA com o México

Joseph Jimenez, de 26 anos, conta ao R7 que a crise humanitária em Eagle Pass piorou drasticamente nos últimos tempos

Data: Segunda-feira, 07/08/2023 08:34
Fonte: Sofia Pilagallo, do R7

Sob temperaturas escaldantes, fome, sede e cansaço extremo, milhares de migrantes se reúnem todos os dias nos arredores de Eagle Pass, no estado americano do Texas. A cidade faz fronteira entre os Estados Unidos e o México e é o local com o maior fluxo de migrantes do país. Ao R7, Joseph Jimenez, de 26 anos, que nasceu em Eagle Pass e viveu lá a maior parte de sua vida, conta que já viu muitos atos de crueldade contra pessoas que tentam fazer a travessia ilegal. Hoje, ele mora em Austin, capital do estado, mas ainda visita a cidade com frequência.

"Algumas pessoas, inclusive eu, costumam deixar água em pontos estratégicos, por onde é sabido que passam muitos migrantes. Quando os agentes de fronteira veem esse tipo de coisa, eles destroem", afirma.

"Nunca vi ninguém cruzar a fronteira, literalmente, porque as linhas de demarcação entre os dois países ficam longe das áreas urbanas. Mas já vi muitos migrantes escondidos em arbustos. Eles têm medo de falar com qualquer pessoa que seja e parecem sempre assustados", acrescenta.

Jospeh conta que os migrantes em Eagle Pass vivem em constante estado de alerta. Apesar de existirem algumas pessoas solícitas com imigrantes na cidade fronteiriça, há um preconceito muito grande com estrangeiros ilegais, e essas pessoas são constantemente denunciadas às autoridades.

Quando o jovem tinha 10 anos, a avó mantinha um relacionamento com Ramon, um mexicano que morava ilegalmente nos EUA e raramente aparecia em público. Um dia, ele estava varrendo o quintal de casa quando uma senhora, branca, o avistou de longe e ligou para a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA, conhecida como Patrulha da Fronteira. Horas depois, Jimenez o viu entrando em uma van do CBC, e eles nunca mais se encontraram.

Crise migratória

Para Joseph, os agentes de fronteira sempre foram muito duros ao lidar com migrantes que tentam chegar aos EUA. Mas, nos últimos tempos, a situação piorou, à medida que as autoridades adotaram uma política mais rígida para combater a imigração ilegal.

Em março de 2021, o governador do Texas, Greg Abbott, do Partido Republicano, lançou a Operação Lone Star, com o objetivo de proteger as fronteiras do estado, e desde essa época vem aplicando uma série de medidas para impedir a travessia de imigrantes irregulares. Mais recentemente, no início de julho, o governador fortificou a fronteira com arame farpado e mandou instalar uma barreira flutuante nas águas do rio Grande. O objetivo é bloquear ao máximo a entrada de pessoas que tentam chegar ao território americano.

A morte de dois migrantes que nadavam no rio Grande foi o marco da semana passada. Na última quarta-feira (2), o corpo de uma criança hondurenha que se afogou no rio Grande foi encontrado na barreira flutuante. No dia seguinte, um segundo cadáver foi achado nas águas, a uma distância de 5 quilômetros do primeiro. A identidade desse último é desconhecida, uma vez que ele não carregava nenhum documento consigo.

"Isso tudo é muito triste", diz Jimenez. "Esses migrantes fazem a travessia a pé ou de barco porque não têm outro jeito de chegar até aqui. Eles merecem ser tratados com dignidade. Tudo o que essas pessoas querem é comida fresca e um emprego para sustentar suas famílias."

Governo Biden

Na esfera federal, o presidente Joe Biden também vem adotando medidas para combater a imigração ilegal. Segundo a Casa Branca, nos últimos dois anos, Biden "garantiu mais recursos para a segurança da fronteira do que qualquer dos presidentes que o precederam", "implantou o maior número de agentes de todos os tempos" — mais de 23 mil — e "evitou níveis recordes de atos ilícitos de fentanil", droga muito usada para dopar vítimas do tráfico humano.

Biden também instituiu uma política de asilo controversa, a que chamou de "the transit ban" ("proibição de trânsito"), que estabelece uma série de imposições aos solicitantes de asilo. O texto exige que essas pessoas não tenham passado por outro país na rota para os Estados Unidos nem solicitado asilo antes de tentar o recurso no país americano. Além disso, elas precisam utilizar um aplicativo para marcar uma entrevista com uma agência do governo, o que pode demorar semanas ou meses.

No fim de julho, um juiz federal chamou essa nova política de "contrária à lei", porque violava os estatutos federais existentes que exigem que os EUA permitam a qualquer pessoa solicitar asilo no país, independentemente de como ela chegou ao território americano. Mas na última quinta-feira (3) um tribunal federal decretou que o governo Biden poderia seguir aplicando sua dura política por algumas semanas, enquanto os advogados do governo apelam da ordem de um juiz que tenta derrubá-la.

Para a advogada Paula Infante, especialista em direito internacional e direito migratório, uma das razões para a atual crise migratória nos EUA está na promessa de campanha de Biden em 2020, quando foi eleito, de legalizar 11 milhões de imigrantes irregulares no país. O projeto não foi aprovado no Congresso, mas serviu como incentivo para aqueles que queriam imigrar, levando a uma "explosão" de pessoas na fronteira. Para contornar o problema, ele teve que adotar medidas drásticas.

"O que de fato ocorreu no governo Biden foi a perda de controle nas fronteiras dos EUA, principalmente com o México", afirma Paula.

"Por causa disso, o presidente tem sido muito criticado e pressionado, principalmente por governadores de diversos estados, a aumentar a segurança nas fronteiras e a desencorajar pessoas de entrar ilegalmente no país", acrescenta.

As medidas para conter a imigração ilegal nos EUA vêm surtindo efeito nos últimos meses. Segundo os dados mais recentes do governo, divulgados em junho de 2023, foram registrados 99.545 encontros nos portos de entrada ao longo da fronteira sudoeste, onde se encontra o estado do Texas, uma queda de 42% em relação a maio de 2023. Esse é o número mensal mais baixo de encontros na fronteira do sudoeste desde fevereiro de 2021.

No fim de semana de 8 a 9 de julho, a Patrulha da Fronteira encontrou os restos mortais de dez migrantes em meio a uma onda de calor prolongada nos estados do Texas e do Arizona. Dados preliminares apontam para outros 70 migrantes mortos recuperados ao longo da fronteira em junho. Mudanças intensificadas pelas mudanças climáticas estão tornando a fronteira mais mortal durante os meses mais quentes do verão.

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