Uma ala governista da CPMI do 8 de Janeiro tem resistido à ideia de convocar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para depor na comissão. Na avaliação de parte dos parlamentares que compõem a base do governo, um possível depoimento colocaria Bolsonaro sob os holofotes e poderia ajudar o ex-chefe do Executivo a emplacar a versão de que ele não teria relação com os atos extremistas.
A relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), tem evitado cravar a possibilidade de um convite ou convocação de Bolsonaro. Em outras ocasiões, ela disse que o tema só seria posto em pauta caso houvesse materialidade para a ação.
Até o momento, só há um requerimento que sugere a oitiva do ex-presidente. Trata-se de um pedido de convite, o que significa que, caso o requerimento seja aprovado, Bolsonaro não tem obrigação de comparecer.
No entanto, na visão de parte da base governista, a melhor estratégia é fechar o cerco contra o ex-presidente, associando-o com o caso da venda ilegal de joias no exterior. Se ficar comprovado que as joias supostamente vendidas pelo ex-ajudante de ordens Mauro Cid ajudaram a financiar os atos golpistas, esse fato já seria suficiente para um possível indiciamento de Bolsonaro.
Um outro braço de atuação dos governistas mira a associação de Bolsonaro com o hacker Walter Delgatti Neto. Em depoimento à comissão, o hacker afirmou que teve um encontro com o ex-presidente no Palácio da Alvorada em que foi levantada a hipótese de ele implantar um “código malicioso” em uma urna eletrônica fora das dependências do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para induzir os eleitores a duvidar da integridade do sistema.
De acordo com o hacker, durante o encontro o então presidente da República também teria sugerido que ele auxiliasse técnicos do Ministério da Defesa a apontar ao TSE fragilidades das urnas eletrônicas.
A falta de acordo entre governistas e oposição tem travado a pauta do colegiado. Nesta terça-feira (22), a reunião que votaria requerimentos com pedidos de quebra de sigilo foi cancelada por causa da divergência entre os dois grupos.
O acordo é necessário porque o presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA), não tem publicado a pauta com antecedência. Com isso, a votação dos requerimentos de convocação de testemunhas ou de quebra de sigilos só pode ser feita por acordo entre os membros da comissão. Com isso, mesmo com maioria na CPMI, os governistas precisam fechar acordo com a oposição.
Os parlamentares ligados à atual base governista defendem a quebra dos sigilos telemáticos e telefônicos do ex-presidente Jair Bolsonaro, da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto, e do ex-advogado de Bolsonaro Frederick Wassef.
Para Eliziane, a prioridade é reconvocar o tenente-coronel do Exército Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e quebrar os sigilos das pessoas citadas pelo hacker Walter Delgatti Neto na última reunião da CPMI.
Parlamentares da base governista também querem investigar se as joias supostamente vendidas por Mauro Cid teriam ajudado a financiar os atos golpistas. “Não é a investigação do crime em si, mas é a investigação se o dinheiro desse crime de fato foi para o 8 de Janeiro”, comentou Eliziane.
Por outro lado, a prioridade de deputados e senadores da oposição é ouvir o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Gonçalves Dias e aprovar requerimentos que pedem a convocação dos comandantes da Força Nacional, que é ligada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. O depoimento de Dias foi marcado para o próximo dia 31 de agosto. Já a convonvocação dos dirigentes da Força Nacional ainda precisa de acordo.
A oposição também rejeita investigar as denúncias sobre a venda de joias recebidas como presente enquanto Jair Bolsonaro era presidente. Segundo o senador Marcos Rogério (PL-RO), o caso não tem relação com os atos extremistas. “[O que] os governistas tentam fazer aqui é criar uma cortina de fumaça”, afirmou.
Para fazer um contrapeso à pressão dos governistas nesse caso, a oposição protocolou três requerimentos que pedem informações sobre os presentes recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Polícia Federal, à Diretoria de Documentação Histórica do Gabinete Pessoal da Presidência da República e ao Tribunal de Contas da União. Os ex-presidentes Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT) também são alvo dos pedidos.