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A crueldade do abandono das mulheres com câncer

O amor, o companheirismo e o compromisso são pilares na batalha contra o câncer feminino

Data: Segunda-feira, 30/10/2023 11:07
Fonte: Do R7

Essa importante reflexão não poderia jamais faltar no encerramento do mês do Outubro Rosa, de prevenção ao câncer ginecológico.

diagnóstico de câncer tem um impacto significativo na trajetória do indivíduo. Medos, incertezas e desconfortos físicos causados pela doença e seu tratamento passam a ocupar lugar central na vida do indivíduo.

O sofrimento abrange diversas dimensões, e usamos o termo em inglês “distress”, definido como uma experiência multifatorial desagradável e angustiante, de natureza psicológica (cognitiva, comportamental e emocional), social, espiritual e/ou física, que pode interferir na habilidade de lidar efetivamente com o câncer, seus sintomas físicos e tratamentos.

O sofrimento pode ir desde a percepção da própria vulnerabilidade, tristeza, fantasias e medo ante o desconhecido, sendo considerado uma resposta natural da pessoa que vivencia a doença e seu tratamento, até reações mais intensas, levando a um distúrbio psiquiátrico diagnosticável. Em cerca de 1/3 dos pacientes com “distress” significativo ocorre a evolução para depressão, ansiedade, transtorno de ajustamento e transtorno do estresse pós-traumático.

Ainda, por questões de preconceito e estigma, temos uma baixa procura por suporte psíquico dos pacientes oncológicos. Os principais fatores incluem: 1) baixo interesse dos próprios pacientes em discutir questões emocionais, já que privilegiam os sintomas físicos; 2) conhecimento insuficiente do tipo de apoio que pode receber; 3) medo de ser estigmatizado; 4) paciente aguarda que o oncologista aborde o assunto.

Alguns oncologistas relutam em discutir aspectos emocionais por entenderem sintomas somáticos depressivos como secundários ao câncer. Em algumas situações, os sintomas depressivos e ansiosos são até considerados reações normais, e isso impede o diagnóstico e o tratamento corretos, aumentando diversos riscos envolvidos.

Segundo um estudo com 21 mil pacientes, a taxa de depressão pode variar entre 2% e 56% dos pacientes, enquanto 44% dos pacientes sofrem de algum grau de ansiedade e 23% têm sofrimento significativo. As maiores prevalências de depressão ocorrem em pacientes com câncer de pulmão (13%), câncer ginecológico (10,9%) e câncer de mama (9,3%). Mulheres mais pobres, jovens e isoladas são as mais afetadas. A depressão ocorre mais no primeiro ano após o diagnóstico.

Em um estudo com 4,7 milhões de pacientes com câncer, 2.491 pacientes cometeram o suicídio — e o risco de suicídio foi 2,7 vezes maior nos primeiros seis meses após o diagnóstico.

Infelizmente, dentro desse contexto, observamos mulheres que enfrentam essa luta, seja contra o câncer, seja contra a depressão, sem o apoio do companheiro. Recentemente, tivemos na imprensa o caso da cantora Preta Gil, que precisou lidar com o abandono do marido nessa fase superdifícil. E isso está longe de ser uma exceção: segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia, 70% das mulheres diagnosticadas com câncer lidam com o abandono do parceiro durante o tratamento.

Isso deixa claro que há falta de reciprocidade no que diz respeito aos cuidados que as mulheres cuidadoras dispensam ao marido quando ele adoece, demonstrando a faceta de uma sociedade machista ou mesmo da fragilidade e confiabilidade do relacionamento que se supunha ser sólido.

O fato de que a rede de apoio é fundamental torna-se irrefutável para o enfrentamento de todos os desafios após o diagnóstico e também durante o tratamento. A rede de apoio auxilia a mulher a enfrentar os inúmeros desafios físicos e mentais da doença, ajudando-as no aumento da resiliência. Pensemos nisso!

Por fim, convido a todos vocês para o lançamento do livro Tratado de Saúde Mental da Mulher, no dia 11 de novembro, sábado, na Livraria da Vila do Shopping Higienópolis, das 15h às 18h. Este e outros assuntos serão debatidos de forma didática e com as melhores evidências possíveis. Maiores informações no meu Instagram@profdrjoelrennojr.

Referência de leitura para profissionais de saúde:

1. Tratado de Saúde Mental da Mulher, Editora Manole, 2024 (lançamento)

2. Seção 5 — Interconsulta Psiquiátrica — Capítulo 14: Interconsulta em Oncologia
Livro: Clínica Psiquiátrica, Volume 2, As Grandes Síndromes Psiquiátricas
Autora: Simone Maria de Santa Rita Soares
Editores: Eurípedes Constantino Miguel, Beny Lafer, Helio Elkis e Orestes Vicente Forlenza
Editora Manole