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A Cilada da Morte

Ninguém se prepara para morrer, porque morrer é uma surpresa ingrata que vem sem aviso.

Data: Segunda-feira, 29/07/2024 18:05
Fonte: Simoni Bergamaschi

Ninguém está realmente preparado para morrer. A vida segue seu curso e, no meio das rotinas e imprevistos, raramente paramos para contemplar a finitude. Um dia, você sai à noite, bate papo com amigos, ri das piadas, e quando volta para casa, não se preocupa em deixar o quarto arrumado. A mente está tomada pelo cansaço, os pensamentos dispersos em coisas triviais. Você deixa a roupa suja no canto, prometendo a si mesmo que vai cuidar disso no dia seguinte. O sapato, sujo da última caminhada, fica esquecido ao lado da porta, à espera de uma limpeza que nunca chegará.
E então, de repente, a morte vem. Outras pessoas se veem na ingrata tarefa de mexer nas suas coisas, de arrumar o seu quarto, de colocar a sua roupa suja no cesto. Aquela bagunça que parecia tão insignificante se torna um fardo para quem fica. O sapato sujo é limpo por mãos que não são as suas, e o quarto, que era um reflexo da sua presença, é reorganizado por quem tenta lidar com a ausência.
Entre as anotações espalhadas, um guardanapo de papel chama a atenção. Nele, uma receita de risoto incrível, algo que você pretendia experimentar, mas nunca teve tempo. A vida, com sua pressa e urgência, não deu espaço para que você realizasse aquele pequeno desejo culinário. Assim como tantas outras coisas, a receita fica, um lembrete silencioso de planos não concretizados.
Morrer é uma cilada. É a interrupção abrupta de histórias, sonhos e rotinas. É deixar para trás conversas inacabadas, promessas adiadas, projetos interrompidos. É a certeza de que a vida continua para os outros, mas não para você. É a prova de que, por mais que tentemos controlar o nosso destino, há sempre algo além do nosso alcance.
Ninguém se prepara para morrer, porque morrer é uma surpresa ingrata que vem sem aviso. E, nesse cenário, o que resta são os pequenos detalhes da vida cotidiana – o quarto desarrumado, o sapato sujo, a receita não testada – que ganham um novo significado. São as marcas da existência que, de repente, se transformam em lembranças para quem fica.

 

Simoni Bergamaschi

 

 

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