O engenheiro sanitarista e professor da Universidade Federal de Mato Grosso, Rubem Palma de Moura, especialista em Hidráulica e Saneamento, avalia que muitas mudanças seriam necessárias para que a qualidade da água no rio Cuiabá fosse melhorada. Nesta quinta-feira (22) é comemorado o Dia Mundial da Água, com o objetivo de alertar a população internacional sobre a importância da preservação da água. O especialista, no entanto, afirma que a população cuiabana ainda não está consciente da importância desta preservação.
O lixo jogado no Rio Cuiabá desce e vai parar na Baía de Chacororé, a maior do Pantanal. Com o final do período de chuvas, mais dejetos ainda devem ser levados pelo rio até a baía antes do período de seca, mais ou menos no mês de julho. Rubem diz que o próprio lixo jogado nas ruas acaba sendo levado por enxurradas, em dias de chuva, para o rio, em direção à baía, onde forma camadas de lixo sob o solo.
“Eu costumo dizer que o lixo daqui sai com passagem de ida sem volta para Chacororé. Este lixo entrou para lá por um canal que tem uma determinada velocidade, encontra a baía que é um ambiente lêntico, ou seja, não há praticamente velocidade ali dentro, então o lixo tende a parar ali. E na medida que a baía for descendo este lixo chega ao solo, lá pelo mês de julho ele já está encostado no solo, por enquanto ele está flutuando. Na próxima cheia, do ano que vem, quando vier, este lixo vai ser encoberto pelo material que é transportado e sedimenta na baía, acontece uma estratificação de lixo, vai formando camadas”.
De acordo com o engenheiro sanitarista, por causa do terreno urbano de Cuiabá, existe uma dificuldade para resolver o problema do saneamento básico. Ele afirma que sem uma ocupação ordenada é difícil de se fazer ações de saneamento.
“A ocupação desordenada do solo urbano de Cuiabá, uma cidade que vai completar 300 anos, é algo que favorece este tipo de coisa, mas o mais sério é que as ocupações dos últimos 40 anos são tão ruins, ou até piores, daquelas que aconteceram há 100 ou 150 anos, a não ser os loteamentos dos condomínios fechados, que aí sim o Ministério Público, os órgãos fiscalizadores, olham com um olhar aguçado e aí se faz a coisa certa”.
Uma pequena parte da água consumida na capital vem do Rio Cuiabá. A situação, no entanto, poderia ser pior. Rubem disse que se não fosse o complexo de Manso a qualidade da água do Rio Cuiabá seria muito inferior.
“Mais de 80% da água de Cuiabá vem do complexo de Manso, e lá não está poluída, pode ser que um dia venha a ficar, se nós ocuparmos irregularmente. E Manso foi um grande aliado do Rio Cuiabá, porque ele aumentou a vazão do Rio Cuiabá em 2,3 vezes, isto quer dizer que o poder de diluição foi muito grande. Se nós estivéssemos vivendo no passado, com 80 m³/s de água, em uma época de seca com certeza nós teríamos vivido um problema seríssimo de qualidade da água, não para consumo somente, mas principalmente para a vida aquática”, explica o especialista.
Rubem afirma que o saneamento básico na capital não é feito da forma correta e que a situação não tem previsão de melhoras, já que nas últimas gestões não foram feitas obras para renovar o sistema.
“Nós temos aí mais de 20 anos sem investir em esgotamento sanitário dentro da cidade, inclusive isto já poderiam ter sido resolvido há muito tempo. Estaríamos tratando sem deixar cair no Rio Cuiabá. O esgoto que é veiculado pelo Mané Pinto, Prainha, Gambá e Barbado, representa 50% do esgoto gerado em Cuiabá, e como na capital em 2/3 do ano não há chuva, nós já teríamos livrado esta carga poluidora do rio, isto seria um ganho muito grande. E tem os outros sistemas autônomos espalhados por aí, que nós conseguiríamos ter 75% do esgoto tratado”.
Em períodos de chuva a vazão do Rio Cuiabá aumenta muito. Segundo Rubem, ela fica em torno de 300 m³ de água por segundo. O que é jogado, segundo o engenheiro, não passa de 6 m3/, e se isto fosse tratado o rio suportaria a agressão.
“Mas o ideal é que tenha absoluta coleta e tratamento do esgoto produzido, só que isso é muito difícil em Cuiabá pela ocupação desordenada do solo urbano”, afirma.
O engenheiro sanitarista acredita que a maior parte da população cuiabana ainda não se preocupa com a preservação do rio.
“Vou te contar uma história, no córrego do Gambá, ali próximo à avenida Senador Metelo, na primeira casa mora uma senhora que joga todo o lixo dela dentro do córrego. Um dia eu resolvi conversar com ela, falei ‘a senhora sabe que isto daqui vai chegar no rio, vai ter problema’, ela virou para mim e falou ‘o lixo é meu e eu faço dele o que eu quiser, e para de encher o saco’, então não sei se essa falta de educação, de conscientização é de todo mundo, mas eu acho que uma parcela considerável da nossa população não tem consciência sobre a preservação do rio”.