A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT), frente a um lamentável ataque à advocacia promovido pelo juiz de Direito Fábio Petengill, com atuação na comarca de Juína, vem, publicamente, repudiar o fato e restabelecer a verdade.
Em abril deste a OAB Juína divulgou carta aberta à população informando que os advogados e advogadas da região não mais aceitariam a nomeação dativa por parte do Poder Judiciário local em razão da reiterada falta de pagamento pelo Estado quanto aos serviços prestados por estes profissionais. Mato Grosso já acumula um passivo de aproximadamente R$ 40 milhões em débitos desta natureza.
O advogado que atua na iniciativa privada é nomeado defensor dativo em processos judiciais quando não há estrutura suficiente da Defensoria Pública para assegurar atendimento jurídico à população hipossuficiente, de forma que o Estado, responsável pela garantia de acesso à Justiça nestes casos, tem o dever de remunerar os profissionais nomeados. Necessário esclarecer, desde logo, que os advogados dativos nomeados têm, na maior parte das vezes, honorários arbitrados judicialmente abaixo do valor da tabela da Ordem, chegando, por isso mesmo, a ser uma remuneração que beira ao simbolismo, que a despeito disso deve ser honrada, revelando-se verba de natureza alimentar.
Frente à recusa justificada dos advogados em aceitar nomeações na referida comarca, o Ministério Público ajuizou ação civil pública em face da Defensoria Pública de Mato Grosso para que fosse garantida aos hipossuficientes representação nos processos judiciais. Na última terça-feira (15) o juiz Fábio Petengill, analisando referida ação, declarou em liminar deferida que a situação de emergencialidade na localidade é decorrente do “movimento paredista” deflagrado pelos advogados militantes na comarca. Registrou que “... a situação processual dos mais necessitados, especialmente no âmbito processual penal, se transformou em um não-direito, porque inexiste assistência jurídica na Comarca, de nenhum tipo, de nenhuma espécie, e se ainda é possível que se realize um de dezenas de atos judiciais que vem sendo redesignados, suspensos, cancelados, isto se dá porque, vez ou outra, surge alguém abnegado, altivo, com grandeza de caráter suficiente para ‘desafiar’ a ‘greve’ dos advogados da região”.
Interpreta-se das palavras do magistrado que todos os advogados e advogadas que passaram a recusar nomeações dativa na região não têm grandeza de caráter, atuam sem nobreza, como se fossem esses profissionais os responsáveis pelo estado de colapso no atendimento da população carente.
Contudo, exatamente ao contrário dos impropérios lançados à classe pelo mencionado juiz, foi justamente a grandeza de caráter dos profissionais da advocacia, que ano após ano se dispuseram a trabalhar mesmo sem receber seus honorários - verba alimentar que garante a subsistência familiar -, que a comarca de Juína se manteve ativa e, inclusive, quadruplicou o número de processos em tramitação nas últimas duas décadas.
Conforme assinala o próprio magistrado, atualmente tramitam cerca de 16 mil processos no Fórum da Comarca, situação esta que demonstra o trabalho árduo e ativo da advocacia militante na região, injustamente penalizada pelas duras e injustas palavras proferidas.
Causa perplexidade à OAB-MT presenciar um juiz de Direito, que já exerceu a advocacia, e, portanto, deveria saber quem é o verdadeiro responsável pelo problema, imputar a profissionais indispensáveis à administração da Justiça (Art. 133 da Constituição Federal), que tantas vezes preencheram lacunas deixadas pelo Estado, a pecha de maus-caracteres, apenas porque passaram a recusar a trabalhar sem remuneração frente ao "calote" institucionalizado.
Registre-se que na própria decisão onde foi proferido o discurso ofensivo o magistrado lembra que desde 1999 a advocacia já vinha reclamando da falta de pagamento dos dativos por parte do Estado, detectando que a região carecia, como carece até o momento, da falta de estrutura da Defensoria Pública.
Frente à situação de colapso anotada na decisão, sugestionando que advogados deveriam continuar trabalhando sem remuneração, já que, ao não fazê-lo, demonstravam anemia de caráter, deixou o juiz Fábio Petengill de dizer qual sacrifício nas finanças pessoal estava fazendo para não merecer o adjetivo que escolheu aos honrados advogados. Já que os advogados deveriam continuar atuando sem receber, por que referido magistrado não abriu mão de 30 dias de suas férias anuais - já que possui direito a 60 - para nesse período despachar e decidir exclusivamente processos de hipossuficientes? Assim não agindo, é lícito ofender mencionado juiz quanto ao seu caráter? Evidente que não; assim como é repudiável sua conduta de ultrajar inúmeros profissionais honestos, altivos, única a exclusivamente por exercerem um direito que é o de receber verba alimentar.
A OAB-MT tem ciência que o pensamento exarado pelo Juiz Fábio Petengill é isolado, fruto de absurda infelicidade, que não reflete a visão de outros membros do Poder Judiciário, que têm demonstrado, diariamente, salvo casos pontuais como o presente, respeito a esses profissionais de valor.
A Ordem segue buscando uma solução administrativa para o pagamento dos advogados dativos. Além disso, como representante da sociedade civil, luta por melhorias na Defensoria Pública, que, mesmo diante da modesta estrutura, vem demonstrando o valor dos seus membros, que se desdobram para atender tamanha demanda.
Não admitirá a OAB-MT, em contrapartida, ilações ou imputações indevidas à advocacia, reconhecendo a licitude nas recusas a essas nomeações.