O servidor público e obreiro evangélico Ismail Daniel Caetano, 34 anos, costumava buscar refúgio na bebida e nas drogas durante a adolescência. Aos 13 anos, já se embriagava. Anos depois, começou a usar maconha. Na vida adulta, também se tornou usuário de cocaína. Há 12 anos, porém, afirma que decidiu melhorar a vida e abandonar tudo isso. Ele acredita que tem uma história de vida inspiradora para esta terça (26), Dia Internacional de Combate às Drogas.
Ismail afirma que as drogas funcionavam como escape para lidar com situações frustrantes como a separação dos pais e as dificuldades financeiras enfrentadas pela família, que no passado tinha boas condições. "Era uma necessidade para que eu pudesse encontrar a felicidade e superar essas frustrações", explica.
Para fugir da própria realidade, também costumava usar medicamentos excessivamente. "Eu consumia todas essas drogas em festas ou em casa, escondido". Na época, vivia em Vila Velha, no Espírito Santo.
A vontade de consumir as drogas era tamanha que o servidor chegou a acreditar que a única forma para se livrar do vício seria tirando a própria vida. "Eu entendo, hoje, que um abismo puxa o outro. Tentei o suicídio por pensar que nada resolveria a minha vida. Tomei 60 comprimidos de antidepressivos. Mas os médicos conseguiram me reanimar", conta.
Depois da tentativa de suicídio, ele ficou internado em uma clínica de recuperação por três meses. Posteriormente, se mudou para Cuiabá, em 2004, e continuou no ritmo que tinha em Vila Velha. "Vida louca. Eu morava sozinho e gozava de uma suposta liberdade, que na verdade era meu aprisionamento. Eu tinha que beber ao acordar, fumar para dormir, enfim, era uma loucura", pontua.
"Meu salário nunca dava, porque eu sempre gastava tudo antes de terminar o mês. Por diversas vezes não tinha o que comer em casa durante o mês. Muitas vezes contava com a ajuda dos meus melhores amigos da época", acrescenta.
Em 6 de setembro, de 2006, às 19h – ele faz questão de frisar a data –, Ismail entrou em coma alcoólico em casa. Socorrido, chegou a ser internado na UTI. "Não morri porque Deus não permitiu. Então, fui procurar ajuda em uma igreja", relata.
Ele considera que aquela data foi o recomeço de uma nova vida. Logo que teve alta hospitalar, decidiu procurar uma igreja e passou a ser religioso. Desde então garante que não consumiu maconha, cocaína, bebida alcoólica ou outros itens que costumava usar.
“Faz 12 anos que não me envolvo mais com essas coisas. Agora meu papel é ajudar quem está exposto a esse tipo de problema. Entendo que é necessário passarmos por lutas para que, futuramente, possamos ajudar os que passam pelos mesmos problemas”, declara.
Desde 2006, o servidor frequenta a Assembleia de Deus Nova Aliança. Ele afirma que a religiosidade foi fundamental para que pudesse deixar os hábitos do passado. "Há nova anos lidero jovens e adolescentes da minha igreja. Eu procuro fazer a prevenção a drogas com base na minha própria história", diz.
"Ajudo jovens que passam pelas mesmas dificuldades que passei, como separação de pais, problemas emocionais e outras coisas. Eu consolo como fui consolado por Deus", acrescenta.
Há oito anos, ele é casado com a médica veterinária Géssy Gabriela, que conheceu na igreja. Juntos, eles têm uma filha de dois anos. "Eu já experimentei de tudo e nada se compara com a vida que tenho agora. Não estou excluído de lutas, pois passo por problemas financeiros ou de saúde, como qualquer pessoa, mas hoje tenho duas coisas que não tinha e costumava procurar nas drogas: a paz e a alegria", assevera.
Casos diferentes
A história de Ismail é considerada um exemplo para aqueles que buscam deixar as drogas ilícitas. No entanto, a psicóloga Zeni Luersen, coordenadora da Comissão de Direitos Humanos e Políticas Públicas do Conselho Regional de Psicologia, destaca que há diferentes histórias relacionadas ao tema e menciona que é importante que cada caso seja analisado individualmente, para que a pessoa possa apresentar melhores resultados na luta contra os entorpecentes.
"A ideia do tratamento e cuidado com uma pessoa que usa drogas seguirá na mesma condição de individualidade, de respeito ao modo e tempo de cada um para dar conta de suas questões", diz.
"A complexidade e multifatoriedades da questão não nos permite receitas prontas ou respostas simples e fáceis. Isso seria centralizar o problema na droga e não nas pessoas. A família precisa buscar ajuda tanto quanto à pessoa quanto em relação ao uso das drogas", completa.
Zeni é contrária à ideia do “combate às drogas” no setor da psicologia. "O que vamos é cuidar de pessoas. Quem combate as drogas é a polícia, porque aí estamos falando em combate ao tráfico ou outras coisas nesse sentido", pontua.
"Historicamente, tivemos uma política voltada para a demonização das drogas, a questão do encarceramento e de tolerância zero. Por isso, hoje temos uma política, na saúde, na qual priorizamos as pessoas e não demonizamos a droga, porque temos uma outra visão para olhar e cuidar dessas pessoas, porque entendemos que a questão é referente ao uso que o sujeito faz da droga e não ela em si”, diz.
Para a psicóloga, haverá melhores resultados nos tratamentos quando houver mais apoio do Poder Público. “As pessoas precisam ter acesso à saúde, deve haver uma atenção integral em suas necessidades e cuidados. É importante esse resgate da sua cidadania e dignidade, além de não violarem os seus direitos enquanto pessoa. É preciso haver inclusão e, para isso, esse tratamento deve ser feito em liberdade”, afirma.