A Rodovia Emanuel Pinheiro (MT-251), que liga Cuiabá a Chapada dos Guimarães, é uma das estradas mais procuradas pelos cuiabanos nos finais de semana devido à infinidade de opções de lazer.
O problema é que essa comodidade e proximidade representam também um perigo: o consumo de álcool por parte de motoristas.
Conforme dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp), de janeiro a abril deste ano foram contabilizados três homicídios culposos resultantes de acidentes. E 11 de lesão corporal culposa. Os registros não especificam quais foram causados por condutores alcoolizados.
Usando um aplicativo de navegação, a reportagem contabilizou nada menos que 25 bares e restaurantes, além de pousadas, à beira dos 65 quilômetros que separam as duas cidades. Isso significa um ponto de venda de bebida alcoólica a cada 2,5 km. E a conta não considera estabelecimentos instalados fora das margens da estrada.
Com um cenário tão favorável ao consumo de bebida alcoólica, muitos questionam a inexistência de uma legislação que proíba a venda, bem como uma fiscalização mais intensa.
Um dos que cobram uma legislação proibindo a venda de álcool à beira das rodovias é o delegado titular da Delegacia Especializada de Delitos de Trânsito (Deletran), Christian Cabral.
"É incongruente você não tolerar a direção sob efeito de álcool e, ao mesmo tempo, permitir a venda de bebidas em locais em que os consumidores obrigatoriamente necessitam conduzir seus veículos para lá chegarem, como é o caso da MT-251", argumentou.
Há dez anos o Governo Federal promulgou a Lei Seca que, entre outras medidas, proibiu a venda para consumo de bebidas alcoólicas em estabelecimentos às margens das rodovias federais. No entanto, não existe em Mato Grosso uma regulamentação semelhante em relação às rodovias estaduais.
Segundo Cabral, o Brasil peca neste quesito em comparação com países desenvolvidos. E Mato Grosso mais ainda.
"Em muitos países classificados como de Primeiro Mundo, a venda de bebidas para consumo, em varejo no local, é proibida, tanto nas rodovias, quanto na área urbana, o que é o mais correto", destacou.
Para Cabral, a imprudência dos condutores é o principal fator para esses registros. "A MT-251 ainda registra muitos acidentes em decorrência da imprudência dos motoristas, seja por abuso de velocidade ou ingestão de álcool", afirmou.
Bares e restaurantes na MT 251
Ao longo de uma rodovia com dezenas de comerciantes, um se destaca por se negar a vender bebidas alcoólicas em seu estabelecimento.
De acordo com o empresário Jose Odir Oliveira, dono do restaurante Caminho das Águas, a decisão se deu para conscientizar os clientes a não pegarem a estrada alcoolizados.
“Eu tenho o restaurante há 8 anos. Já presenciei muitas mortes aqui causadas por motoristas embriagados. Por isso decidi não vender mais nenhum tipo de bebida com álcool”, explicou.
O comerciante explica que, apesar da decisão, o movimento de clientes chegou a aumentar em seu estabelecimento.
“Alguns comerciantes vizinhos têm medo de deixar de vender bebida alcoólica para não perder o movimento. Mas, na verdade, é o contrário. Muitas pessoas têm consciência do perigo de dirigir embriagadas. E quando encontram a opção de poder ir a um restaurante que não incentive o consumo, é ali que eles vão querer ir. Aqui o movimento só aumentou”, destacou.
Exame de alcoolemia
A Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp) não calcula dados de acidentes causados por motoristas alcoolizados em Mato Grosso. Um dos empecilhos é a constante interrupção dos exames de alcoolemia realizados pela Diretoria Metropolitana de Laboratório Forense da Politec.
Os serviços foram suspensos de outubro de 2016 a maio de 2018 devido à falta de reagentes e manutenção dos equipamentos.
O problema aconteceu após um vazamento de gases, levando à necessidade de manutenção e reposição dos reagentes.
Para o delegado Christian Cabral, mais do que a falta do exame para impedir acidentes, o problema maior é a ausência de comunicação entre as forças de segurança.
“Nos temos um problema muito sério em relação as estatísticas de trânsito, não só em Mato Grosso, mas no Brasil inteiro. Porque são muitos órgão que atuam no trânsito e as informações não são compartilhadas. Aqui temos a Polícia Civil, Militar, Semob e a PRF e não há uma comunicação para compartilhamento de dados dos casos atendidos. Sem contar os casos em que os órgão de segurança não são acionados. Então são vários fatores que impedem a quantificação desses números", explicou.
Lei Federal
A Lei federal n.º 11.705, publicada há 10 anos, proíbe a venda e o consumo de bebidas alcoólicas nas rodovias federais do país. No entanto, de acordo com o texto, só é permitida a comercialização de bebidas alcoólicas nos trechos que cortam as cidades.