Mais vulneráveis às ações criminosas, as mulheres têm sido as maiores vítimas de bandidos que praticam sequestro relâmpago, roubos e furtos em Mato Grosso, embora não existam estatísticas estaduais para um panorama geral, pois a Secretaria de Estado de Segurança Pública não separa os boletins de ocorrência relativos aos roubos, furtos e sequestros por gênero. Ou seja, é impossível que o próprio governo perceba um problema se nem os órgãos competentes da segurança pública pensam mensurá-lo.
De acordo com informações da Polícia Militar de janeiro deste ano, no município de Cáceres (225 km de Cuiabá), as mulheres representavam 70% das vítimas de roubos a motocicletas, por exemplo.
O Circuito Mato Grosso realizou um levantamento dos últimos doze meses e localizou em suas publicações três casos em que mulheres foram vítimas de roubos seguidos de sequestro, apenas em 2018, e outros três em 2017. Fora os muitos casos que as vítimas acabam não denunciando.
Uma pesquisa da Datafolha em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aponta que as mulheres, ao lado dos negros, são as vítimas mais vulneráveis à violência urbana. O estudo revela que o Centro-Oeste é a região do Brasil onde as vítimas relatam que o crime de roubos e furtos é o que menos tem sido combatido pela segurança.
O jornal localizou uma vítima que ficou refém de bandidos. A médica veterinária pediu para não ter sua identidade revelada. P.G.S., 28 anos, relatou que passou por um assalto ocorrido em 2017, no bairro Jardim das Américas, região nobre de Cuiabá, em plena luz dia. Ela estava indo ao shopping para um encontro com uma amiga, mas quando chegou, foi rendida por dois homens que estavam em um carro. A vítima foi obrigada a entrar no veículo e levada pelos assaltantes.
“Eu estava na rua de saída da Universidade Federal de Mato Grosso, que fica perto do shopping. Tudo aconteceu por volta das 13h, era domingo, eu estava indo ver um filme com uma amiga quando apareceu este carro, saiu um homem e anunciou o assalto”.
A vítima relata que foi levada pelos bandidos e ficou com eles por aproximadamente uma hora; dentro do carro os bandidos pegaram os seus pertences e queriam ir até um banco para sacar dinheiro, mas acabaram desistindo e soltaram P.G.S. em um local desconhecido.
“Eu fiquei muito apavorada, ano passado eu não conhecia muito bem os pontos principais de Cuiabá, fui largada em algum lugar perto do setor industriário. Na hora eles ficam perguntando quanto eu tinha de dinheiro na conta e eu falei que não tinha nada e de fato não tinha. Um deles disse ao outro: ‘vamos soltar ela e ficar apenas com o celular’. O dinheiro que eu tinha na carteira, duzentos reais e uma corrente de ouro, meu relógio e mais dois anéis de brilhantes, tudo era ouro, valiam 3 mil reais apenas as joias”, disse.
Ela contou que quase uma hora depois de ser levada foi deixada em uma rua que até hoje não lembra onde fica. Ainda de acordo com os relatos, um carro da polícia apareceu, os policiais ficaram dando voltas nas redondezas para encontrar os autores do crime, mas ninguém foi encontrado.
“Eu entrei no carro da PM, estava chorando muito, desesperada, não tinha condições de lembrar de absolutamente nada, até hoje eu não lembro como era o rosto dos assaltantes, nem a cor do carro, fiquei em estado de pânico”, conta.
Segundo a veterinária, os policiais não a levaram para a delegacia, a deixaram em casa. “No outro dia não tinha coragem de sair na rua e nunca fiz um boletim de ocorrência”, relatou.
A vítima conta que ficou traumatizada, levou meses para sair de casa e até hoje tem um certo pânico quando um carro se aproxima. “No primeiro mês eu saía de casa, depois disso eu saía apenas acompanhada, mas o medo era enorme. Hoje eu consigo sair sozinha, mas se alguém se aproxima ou algum carro eu acho que é assalto”.
Os especialistas ainda alertam que como as mulheres são os alvos mais frequentes em ações de roubos e furtos, elas devem redobrar ainda mais a atenção em locais como shoppings, bancos, saída de escolas, estacionamentos, pontos de ônibus, considerados de maior ocorrência de assaltos.
Para quem já foi vítima de roubo, a vulnerabilidade foi apontada como a principal causa. Pelo menos é o que diz outra vítima, que também preferiu não se identificar e relatou quando foi assaltada a caminho do serviço. “Eu estava em um ponto de ônibus onde havia mais dois homens, porém quando o criminoso chegou armado em uma motocicleta, ele só assaltou a mim, e não cometeu nenhum ato criminoso contra os homens que estavam no ponto. Acredito que ele pensou que se assaltasse algum homem ele poderia reagir”.
Um dos casos que mais chamaram atenção em Cuiabá foi o sequestro da empresária Milene Falcão Eubank, que foi mantida em cárcere privado no bairro Centro América, região do Grande CPA, em Cuiabá. A empresária foi capturada quando aguardava o filho sair de uma escola particular, no bairro Quilombo. Os ladrões chegaram, renderam a empresária, obrigaram-na a descer do veículo e colocaram a mesma no banco de trás do automóvel.
Os ladrões agiram rápido e fugiram do local mantendo Milene refém em seu próprio veículo, um Hyundai Santa Fé. A partir desse momento, as forças de segurança foram acionadas e iniciaram intensas buscas. O caso acabou sendo noticiado com mais intensidade, pois a própria família buscou a ajuda da imprensa à época para tentar encontrar o paradeiro da empresária.
De acordo com os policiais que participaram da operação e busca à empresária, o bando agiu sem saber o que realmente fazer na situação. “Eles realizavam saques de pequenas quantias, como mil reais, posteriormente quatrocentos reais, comprando garrafas de uísque, gastaram em conveniência, e apesar de a maioria já ter passagens pela polícia, o sequestro foi consequência de uma ação que seria apenas roubo de veículo”, informou o delegado Marcelo Torhacs.
Segundo o delegado Luiz Henrique Damasceno, no momento em que entraram no cativeiro e encontraram o último suspeito, a empresária estava em um colchão deitada e sob vigilância do criminoso.
“Ela relatou que inclusive deu um terço para o suspeito, que realizou oração com o mesmo para comovê-lo e evitar qualquer tipo de agressão e ainda informou que ele estava calmo enquanto a vigiava e não agiu com violência”. O delegado relatou que Milene estava com uma pequena escoriação no braço.
Especialistas em segurança afirmam que assaltantes escolhem as mulheres devido a alguns aspectos específicos, como o uso de adornos, como joias, que chamam a atenção, e a postura de vulnerabilidade diante do fato, por quase nunca reagirem nessas situações.
Mas nem sempre as vítimas são apenas pessoas que vivem nos bairros de classe média alta. Foi o caso de uma idosa de 62 anos vítima de sequestro relâmpago em novembro de 2017, quando estava no estacionamento de um supermercado, no bairro CPA II, em Cuiabá. Três criminosos armados chegaram ao local, anunciaram o roubo e colocaram a vítima dentro do porta-malas do automóvel.
A vítima relatou à Polícia Militar que foi carregada por alguns quilômetros em poder dos criminosos e liberada em frente à policlínica do mesmo bairro. Os ladrões fugiram com o automóvel da idosa e levaram ainda R$ 70,00 em espécie.
Onze dias depois, policiais militares da Ronda Ostensivas Tático Móvel (Rotam) em uma ação rápida evitaram que outra mulher fosse sequestrada no bairro Jardim das Américas, na capital.
Os policiais estavam na Avenida Fernando Corrêa da Costa, quando foram informados pelo Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp) sobre dois suspeitos literalmente “correndo atrás de uma mulher na Rua Haiti, no bairro Jardim das Américas”.
Imediatamente a equipe de Rotam passou a fazer rondas no bairro quando encontrou os dois suspeitos, identificados como Claudeir Cardoso de Sousa, 23, e U.J.G.A., 15, na Rua Lima, correndo em direção à Avenida Brasília do mesmo bairro. Durante revista na dupla, foram encontrados na mochila que estava em posse do menor de 15 anos um revólver sem munição e uma bolsa preta com os documentos e o dinheiro da vítima M.R.C.M.S., que já tinha sofrido o assalto.
Para se livrar do sequestro, a vítima tinha saltado do veículo em movimento. Ela contou à polícia que após roubarem sua bolsa os suspeitos, em posse da arma, a obrigaram a entrar em um veículo e tentaram amarrá-la para o sequestro.
Durante a tentativa de sequestro, a vítima relatou que abriu a porta do carro em movimento e saltou, mas os suspeitos continuaram a persegui-la. Os suspeitos foram conduzidos ao Cisc.
As vítimas são mulheres de todas as classes.
Já neste ano, os casos de roubos e sequestros relâmpagos contra as mulheres continuam, com as vítimas sendo alvos fáceis dos bandidos. No dia 18 de junho uma empresária teve seu carro roubado no estacionamento de um supermercado em Várzea Grande, quando iria deixar o local com as filhas.
A vítima contou que ao chegar no veículo com as filhas, os dois criminosos armados se aproximaram e consumaram o roubo levando seu veículo e ameaçando-a de morte caso não entregasse as chaves do automóvel.
Ainda neste mês, duas mulheres foram roubadas no mesmo dia, sendo uma em Várzea Grande e outra na capital. Na tarde do dia 5 de julho uma advogada teve seu automóvel Honda HRV tomado de assalto.
A mulher chegava a sua residência, no bairro Jardim Paula II, quando foi abordada pelos criminosos que após roubar o seu veículo o abandonaram horas depois na Vila Operária, zona rural de Várzea Grande, onde criminosos costumam abandonar veículos roubados.
No mesmo dia, a gerente do Plaza Motel, localizado no bairro Despraiado em Cuiabá, sofreu momentos de pânico e tensão, quando criminosos invadiram o local para roubar, e na fuga utilizaram seu veículo para fugir e ainda a levaram como refém.
Os policiais passaram a realizar rondas na região para localizar o automóvel e a vítima, quando em determinado momento o Ciosp informou que a gerente havia sido abandonada na Rua dos Trabalhadores, no bairro Jardim União. Uma equipe foi até ao local e prestou apoio à mulher.
Outra equipe da polícia localizou o veículo e os suspeitos no bairro Jonas Pinheiro. Os criminosos foram perseguidos, houve troca de tiros no local, mas conseguiram fugir.
O que dizem psicólogos sobre o tratamento
Para tentar melhorar o medo e todo pânico ocasionado pelo assalto, muitas vítimas buscam ajuda médica. As consultas com uma psicóloga ajudam as vítimas a recuperar a confiança e voltar a sair sozinhas na rua.
Não precisa ser vítima de sequestro, quem foi vítima de assalto e ficou por alguns minutos na mira de um revolver também pode sofre transtornos e ter necessidade de um tratamento psicológico.
O jornal entrevistou a psicóloga Sara Gomes Prudêncio que atua na área clínica médica e também na área jurídica há oito anos. Ela revela que qualquer indivíduo que passou por uma situação de violência pode ter danos distintos.
“Os danos sofridos variam de pessoa para pessoa, mesmo porque a dor é subjetiva, ou seja, não há parâmetros rígidos e fixos que a definem. O que causa dor em uma determinada pessoa pode por vezes não significar nada para outra pessoa”, explicou Sara.
Entre os principais sintomas de quem passou por um sequestro ou assalto esta o estresse pós-traumático. “Recomendo acompanhamento psicológico de modo sistemático a fim de avaliar e tratar os possíveis danos causados pela situação de estresse pós-traumático”.
A psicóloga revela ainda que durante o tratamento de psicoterapia não há um período determinado de atendimento para restabelecer a pessoa. Alguns pacientes podem ser tratados de forma mais rápida, outros podem levar mais tempo e tudo depende de tempo de tratamento pode variar de pessoa para pessoa; umas vão conseguir ser reabilitadas em pouco tempo e outras podem necessitar de várias consultas. Além disso, tudo depende do tratamento escolhido para o profissional.
Sequestros são crimes preferidos pelas facções
As facções são grupos que se organizam para a prática de crimes; em Mato Grosso a maior facção presente é o Comando Vermelho (CV-MT). Seus membros praticam os mais variados crimes no intuito de arrecadar dinheiro para as organizações criminosas.
As facções têm hierarquia, disciplina e até um código de normas próprio. Uma de suas principais formas de sustentação econômica, além do tráfico de drogas e armas, é o roubo a veículos e prática de sequestro relâmpago e furtos a instituições financeiras.
“A organização criminosa sempre explora o lucro, seja por meio de furto a banco, roubo a banco, tráfico de drogas, roubo de veículos, sequestros relâmpago, entre outros”, disse em entrevista o delegado da Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO), Diogo Santana.
Mesmo com o árduo trabalho das forças de segurança para combater o Comando Vermelho no estado, as brechas nas leis fazem com que alguns detentos considerados de alta periculosidade pertencentes à facção sejam colocados em liberdade no regime semiaberto, com o uso de tornozeleira eletrônica.
Como aumentar a sua segurança
A Poliservice Serviços de Segurança, visando tentar diminuir essa insegurança contra as mulheres, dá dicas de algumas medidas preventivas. Fique atenta e confira as dicas de como aumentar a sua segurança:
1) Sempre preste atenção ao que acontece à sua volta. O uso de celulares ou fones de ouvido nas ruas pode causar distração e fazer com que não perceba a aproximação de marginais;
2) Tire as chaves do carro ou da casa de dentro da bolsa antes de chegar ao veículo. Assim, você não vai chamar atenção por estar mexendo em seus pertences e nem se distrair;
3) Quando sair mais tarde de algum local, ligue para algum parente ou amigo(a), para avisar que está indo embora, naquele horário;
4) Se pegar ônibus em um horário sem muito movimento, sente-se sempre próxima ao motorista;
5) Configure o número da polícia como o primeiro de sua lista de contatos no celular. Certifique-se de que seja de fácil acesso, se precisar acionar rapidamente;
6) Ao andar nas ruas, leve sua bolsa à frente ou a tiracolo, para o lado da calçada. Isso dificulta a atividade dos assaltantes;
7) No trânsito, ande com os vidros fechados e evite falar com vendedores ou pedintes. Nem todos estão com más intenções, mas o importante é se prevenir;
8) Se notar que está sendo seguida, procure algum estabelecimento movimentado e peça ajuda;
9) Evite carregar pertences de alto valor na bolsa ou abrir sua carteira na frente de outras pessoas. Deixe seu dinheiro ou cartão separado, para facilitar na hora das compras;
10) Caso seja abordada por algum delinquente, não reaja e entregue o que ele pedir. Discretamente, tente gravar a sua fisionomia para ajudar a polícia.